MEMÓRIA SOBRE O ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO DOS TRIGOS PORTUGUEZES - João Inácio Ferreira Lapa







Lapa, João Inácio Ferreira - MEMÓRIA SOBRE O ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO DOS TRIGOS PORTUGUEZES REDUZIDOS A VINTE E NOVE TYPOS VULGARES
Lisboa: Typographia da Academia, 1865.
[4], 162 pp.: il.; 29 cm. 
Encadernação com lombada em pele; conserva as capas de brochura; a capa de brochura frontal apresenta uma pequena lacuna; no frontispício tem um pequeno número. 
Um dos primeiros, senão o primeiro, estudo científico sobre o trigo em Portugal.
Obra de referência para a história da agricultura e da panificação.
Raro.
1ª edição.
€48.00
Iva e portes incluídos.


Sobre a vida do autor vide:
https://www.isa.ulisboa.pt/files/id/ferreira-lapa/Ferreira_Lapa-Prof_Quelhas_dos_Santos.pdf

JOÃO INÁCIO FERREIRA LAPA
(1823 – 1892)
Por Joaquim Quelhas dos Santos
(Professor Catedrático Jubilado do Instituto Superior de Agronomia)

Embora, como ainda é do conhecimento de muitos e também pode deduzir-se da vasta bibliografia que nos legou, o Professor Ferreira Lapa se tenha notabilizado, sobretudo, pelo seu importante contributo para o avanço dos conhecimentos na área da Tecnologia Agrícola - razão porque, certamente, alguém desta área irá também escrever sobre ele - não pode, como é fácil depreender-se do que adiante iremos referir, deixar de ser lembrado no domínio
da Química, nomeadamente daquela que, com já dissemos, até há cerca 30 anos era designada por «Química Agrícola».
João Inácio Ferreira Lapa foi diplomado pela pela Escola Médico-Veterinária do Salitre (1844/45) e, logo nesse mesmo ano, ingressou no professorado como lente da cadeira de Anatomia e Fisiologia daquela Escola. Quando, em 1855, ocorreu a fusão da Escola Médico-Veterinária com o Instituto Agrícola de Lisboa, criado em 1852 e instalado no palácio da Cruz do Taboado, foi encarregado da regência da disciplina «Noções de Física, Química e «Meteorologia Aplicadas à Agricultura e Fisiologia Veterinária». Terá sido, assim, o primeiro professor a ensinar Química numa Instituição que, globalmente, podemos considerar destinada ao Ensino Agrícola Superior. A importância atribuída por Ferreira Lapa às matérias situadas no domínio da Química Agrícola viria a fazer com que, quando da passagem do Instituto Agrícola de Lisboa a Instituto Geral de Agricultura (1864), fosse criada a disciplina de Química Agrícola, Tecnologia Rural e Florestal, a qual viria a reger até à sua aposentação em 1886, ano em que a Escola passa a designar-se Instituto de Agronomia e Veterinária; e iria permitir que as matérias incluídas naquela disciplina, até então reduzidas a noções elementares, passassem a constituir, com o complemento das artes agrícolas, uma parte integrante do curso.
Embora não tenhamos encontrado qualquer referência concreta ao facto de Ferreira Lapa se ter aposentado do ensino em 1886, com apenas 63 anos de idade, cremos que uma tal decisão poderá ser associada, fundamentalmente, à profunda reforma que nesse ano ocorreu no Instituto: este passou a designar-se Instituto de Agronomia e Veterinária, a duração dos cursos aumentou de 4 para 5 anos e aumentou também o número de disciplinas, aparecendo individualizadas as cadeiras de Química Geral e Análise, e de Química Agrícola, Análise de Terras, Adubos e Plantas. Ora, Ferreira Lapa, que era Diretor do Instituto desde 1877, terá decidido concentrar mais a sua atividade no desempenho deste último cargo, o qual, aliás, viria a manter até à sua morte, em 1892. Por outro lado, e como certamente será salientado por alguém com melhor informação neste domínio, Ferreira Lapa, dentro e fora do Instituto, terá passado a ocupar-se, prioritariamente, dos problemas situados no domínio da Tecnologia Agrícola. Recorde-se, também, o facto de, como se deduz do que já foi referido, Ferreira Lapa, com aquela idade, ter já lecionado durante 41 anos!
De qualquer modo, como já se disse, Ferreira Lapa foi o primeiro professor de Química no Ensino Agrícola e, tal como adiante procuraremos demonstrar, contribuiu, de forma decisiva, para o avanço dos conhecimentos na área que ficaria identificada com a chamada Química Agrícola.
Por se tratar do ensino de uma ciência experimental, justifica-se que comecemos por salientar o facto de Ferreira Lapa ter criado em 1855, no já referido Instituto Agrícola de Lisboa, situado no palácio da Cruz do Taboado, o primeiro Laboratório de apoio ao ensino da disciplina, onde se começaram a fazer as demonstrações, experiências e análises. Foi também nesse local que instalou o primeiro campo de experiências, constituído por pequenos talhões nos quais efetuou diversos ensaios de experimentação sobre o comportamento de várias plantas cultivadas submetidas a diferentes tratamentos. Seriam, certamente, instalações muito rudimentares e utilizadas em condições precárias. Efetivamente, o Prof. Cincinato da Costa (que viria a ser o seu sucessor na parte da Tecnologia Agrícola), ao referir-se ao Laboratório escreveu em 1926: «uma pequena sala terrena com fraca luz onde sobre numa velha mesa de madeira se acumulavam frascos, retortas e reagentes onde o grande investigador fazia as suas pesquizas»; e quanto ao campo de experiências, diria na mesma altura: «um acanhado horto de poucos metros quadrados de extensão, pequena parte dos já reduzidos jardins da Cruz do Taboado, onde o velho Instituto se achava instalado».
 De notar que as precárias condições proporcionadas por tal laboratório, não terão impedido Ferreira Lapa de efetuar estudos de grande interesse prático. Efetivamente, Rebelo da Silva, na já citada sessão de homenagem a Ferreira Lapa viria a escrever: «Ferreira Lapa, com os poucos recursos da cadeira, conseguiu elevar o nível do ensino que professava e alargar os estudos de Química Agrícola. Aliás, ainda a propósito da possibilidade de se tirar partido de condições laboratoriais deficientes, parece interessante transcrever o que, também a propósito de Ferreira Lapa o já citado Investigador L. Mercês de Mello na abertura dos trabalhos da também já referida I Conferência de Química Agrícola: «de certo modo nenhum investigador pode trabalhar sem equipamento adequado, nem diversos problemas podem ser atacados com êxito sem o auxílio de complicados aparelhos; e, embora a História das Ciências Físicas seja em larga medida a história dos instrumentos e do seu uso inteligente, verdade é também, como escreveu Seifriz (1937), much excelent research has been done with a test tube and a Bunsen burner. Sem dúvida, quem faz o laboratório são primeiramente os homens que nele trabalham, e não as paredes e instalações». As condições existentes no campo de experiência, apesar de precárias, terão permitido, com base em ensaios realizados, lançar, cerca de 1870, a campanha a favor das adubações minerais.
Efetivamente, ainda de acordo com o Investigador L. Mercês de Mello, foi também a Ferreira Lapa que ficou a dever-se, não só o início do ensino dos adubos, mas também a experimentação com o seu uso, a qual foi efetuada nos já referidos talhões instalados nos jardins do palácio da Cruz do Taboado, onde então se situava o referido Instituto, e na quinta da Bemposta, entretanto anexada ao Instituto, na qual foi instalado um ensaio experimental de longa duração (inspirado nos ensaios do conceituado agrónomo francês Georges Ville, em Vincennes) pelo qual ficou responsável, durante vários anos, Filipe da Silva, um dos seus discípulos. A este propósito, é de salientar o facto de Ferreira Lapa, numa altura em que ainda havia muita discussão sobre a validade da teoria da nutrição mineral das plantas, apresentada por Liebig em 1843 e que haveria de levar à descoberta dos adubos de síntese mineral, se ter mostrado um dos mais acérrimos defensores daquela teoria. Conclui-se, assim, que, embora por razões que serão apresentadas a propósito do Prof. Rebelo da Silva, a introdução dos adubos minerais em Portugal surja, mais frequentemente, associada a este Professor, não restam hoje dúvidas de que a iniciativa tem de ser atribuída a Ferreira Lapa. Aliás, de acordo com um livro publicado em 1939 pelo Engo . Agrónomo L. Quartin Graça, sobre «Os Adubos em Portugal», é o próprio Rebelo da Silva que afirma «É ao grande Mestre Ferreira Lapa que o nosso País deve a iniciativa da introdução dos adubos agrícolas para aumentar a produção do nosso solo arável». De acordo com as informações que conseguimos obter, Ferreira Lapa já não terá podido dar grande contributo para a racionalização do uso dos adubos na agricultura com base na análise das terras; mas é uma realidade o facto de ele, no ensino e nalgumas publicações, atribuir particular importância a este novo domínio da Química Agrícola. De facto, embora na sua vasta obra escrita - exaustivamente detalhada num trabalho publicado em 1977 pela Investigadora do ISA, Enga . Agrónoma Maria Luísa Alarcão e Silva - tenham largo predomínio os temas referentes à Tecnologia, também apresentou trabalhos cujo conteúdo se situa, claramente, nos estudos referentes ao aumento da fertilidade dos solos. Cita-se, a título de exemplo, um trabalho apresentado em 1875, que ele intitulou «Chimica agrícola, ou estudo analítico dos terrenos, das plantas e dos estrumes». Como curiosidade, mencionamos o facto, referido por aquela Investigadora, de aquela obra ter obtido um parecer tão encomiástico dos mais eminentes químicos do nosso País que a 1a classe da Academia Real das Ciências votou a sua impressão por conta do seu «cofre». De notar que Ferreira Lapa, ao contrário do que, como mais oportunamente se dirá, aconteceu com a quase totalidade dos que se lhe seguiram no ensino da Química Agrícola, começou a ensinar sem ter qualquer experiência como «agrónomo de campo» (aliás, como já vimos, nem sequer era agrónomo e começou a ensinar no mesmo ano em que concluiu o curso na Escola Médico-Veterinária). Este facto, no entanto, não parece ter trazido qualquer inconveniente para o desenvolvimento da sua brilhante carreira docente e de investigação. Efetivamente, pelo que escreveu e pelo que sobre ele outros escreveram, deduz-se que Ferreira Lapa, para além do que ensinou e da extensa experimentação efetuada, viria a ser reconhecido como um profundo conhecedor dos problemas agrícolas do País.
Assim, como nos diz o já citado Professor Mário D’Azevedo Gomes «a importância especial dada na Reforma dos Serviços de 1886 aos estudos da Química - os maiores núcleos regionais, que hoje se designariam Estações Agrárias, Estações Agronómicas, chamaram-se estações Químico-Agrícolas - é o melhor sinal daquela influência de Ferreira Lapa que, em um dos seus numerosos discursos inaugurais, académicos, fizera a apologia da Química, a do solo, como a tecnologia para o progresso da agricultura». E mais adiante, continuando a referir-se a Ferreira Lapa: «foi Presidente da comissão anti filoxérica do Sul do Reino; vogal do Conselho Superior de Agricultura; Conselheiro do Governo na Exposição Universal de Paris; Membro do Conselho Superior da Exposição Agrícola de Lisboa e Presidente da comissão encarregada da análise dos vinhos ali representados. Tinha o posto de capitão por ter sido lente da Escola Veterinária Militar; sócio efetivo da Academia das Ciências de Lisboa; Oficial da Academia Francesa; membro correspondente da Sociedade Química de Paris e da Sociedade Veterinária do Departamento do Sena; sócio da Sociedade Agrícola do Porto e honorário da Real Associação da Agricultura Portuguesa, da Sociedade Comercial Portuense e da Sociedade de Agricultura Michaelense; Par do Reino e possuidor de várias condecorações». Concluímos, com um depoimento do Investigador Mercês de Mello: «Todos os testemunhos convergem neste reconhecimento: «Ferreira Lapa, o fundador da Química Agrícola no nosso País, foi um grande professor. Grande professor, no seu tempo, pelas qualidades então mais apreciadas; grande professor também pelas qualidades que, para assim se considerar, hoje se requerem. Segundo os depoimentos dos seus discípulos e colegas, as qualidades pedagógicas nele se evidenciavam pelo dom de comunicar o seu pensamento aos discípulos, nas lições que dava a todos os títulos atraentes, cheias de interesse».
 e ainda:
EVOCAÇÃO DO PROFESSOR JOÃO IGNÁCIO FERREIRA LAPA
PELO PROF. JOSÉ E. MENDES FERRÃO
https://www.isa.ulisboa.pt/files/id/ferreira-lapa/Ferreira_Lapa-Prof_Jose_Mendes_Ferrao.pdf