O FULGOR É MÓVEL: em torno da obra de Maria Gabriela Llansol -José Augusto Mourão


Mourão, José Augusto 
- O FULGOR É MÓVEL: 
em torno da obra de Maria Gabriela Llansol
Colecção Faces de Penélope, 
Lisboa: Roma, 2003
202, [2] p. ; 22 cm.
Encadernação editorial com sobrecapa.
SINOPSE
Eis um ensaio invulgar sobre uma mulher-escritora invulgar.
«Maria Gabriela Llansol não é uma singularidade vã. Nem póstuma se pensa.
A arquitectura floral desta escrita, esta estética maravilhante, levanta muita cinza em volta.
Segue-a porém, de longe, uma comunidade de legentes que lidam com a palavra como um vivo e que, como ela, recusam o "assim é" da história e demandam ainda, teimosamente, um espaço edénico, sem uma qualquer teologia do mundo no bolso.
A dificuldade de entrar neste mundo é óbvia. É difícil seguir esta textualidade porque nos obriga a acompanhá-la "fora da luz comum": a leitura aqui obedece a uma outra luz:"luar libidinal", "sexo de ler"?»
Exemplar novo.
1ª edição
€20.00
Iva e portes incluídos.


CECÍLIA BARREIRA (UNL)
"O Fulgor É Móvel",
de José Augusto Mourão
José Augusto Mourão é um ensaísta de fulgurante veia. Nota-se em toda a sua vasta obra de pendor fortemente filosófico. Ora sendo eu uma crítica literária mais ao nível das ideias sociais e sociológicas do que da filosofia, muito do que possa escrever sobre JAM, será sempre redutor.
Mas convenhamos: só filósofos podem ler outros filósofos? Só sociólogos se entendem com outros sociólogos? Penso que poderá haver questões transversais a diferentes domínios do saber.
Maria Gabriela Llansol é uma escritora que não se lê de uma vez só. Tem de se ler, e tresler, porque não é de fácil entendimento. Penso aliás que os filósofos têm a ver com essa escrita elaborada e densa.
A obra divide-se da seguinte forma: "Figuras da metamorfose na obra"; "Onde vais, drama poesia"; "Os lugares da utopia"; "O texto-viagem-comum"; "Literatura e comunicação"; "O corpo das Comunidades"; "Utopias da linguagem"; " Teoria da Litaratura sentada sobre o dicionário"; "Notas sobre o Parasceve"; "Batendo a uma parede do lado da rua". Temos ainda um posfácio e "Maria Gabriela Llansol retrato de um legente".
A escrita de JAM é poética e filosófica simultaneamente, algo críptica para o leitor comum. Mas há passagens admiráveis que nos remetem para os lugares preferenciais de Llansol: "O desejo, liberto do espartilho da psicanálise que o trata como "falta", conduz, produtivamente, para associações novas, simbioses, reinos diferentes; estas passagens para o outro são devires: devir-mulher, criança, animal, planta, fundir-se nos elementos ou tornar-se imperceptível" (p. 179).
Llansol não tem uma escrita linear que contorne um conteúdo específico de pensamentos. É um trilho quase poético de afirmações que se desenrolam numa vibrante mutação. Porque, e aqui encontra-se um crítica forte à dominância comum, "é uma escrita até agora escondida e não canónica - tudo conspira para fazer deste mundo um lugar seguro, para conservar o património, para rentabilizar, para assegurar os circuitos da mesmice" (p. 181).
A "mesmice" também é configurada na dificuldade de certos receptores aderirem a esta escrita, "para quem perdeu a sensibilidade à escrita do diverso".
Depois há a sensatez dos sábios: "Ler não é ver. Os livros são silenciosos, só a escrita fala, se ouve. Ler é emaranhar-se pelos braços do rio adentro" (p. 182).
Escrita notável que entreabre a obra de uma escritora polémica, que quase toda a nossa intelectualidade diz que lê, mas cujos contornos mais recônditos são afinal desconhecidos. E que, como professora da área da literatura e da cultura portuguesas, sei que os alunos das humanidades pura e simplesmente ignoram o nome e a obra de Maria Gabriela Llansol.
Era bom que mais ensaios deste género fossem publicados para projecção de escritores de grande qualidade, ignorados como são pelos media e pelo sistema da "mesmice" em que nos enquadramos.



ASSUNTOS: LLansol, Maria Gabriela, 1931-2008 -- Obra literária -- Crítica e interpretação